Romy Pocztaruk
Romy Pocztaruk
2019, 14min, RS
Romy Pocztaruk
2019, 14min, RS
Antes do Azul
Antes do Azul
Um jorro de imagens-pensamento sobre a existência e a violência, sobre a passagem do tempo, sobre tecnologias de morte, sobre a potência de corpos animais e minerais, sobre a arte como possível rastro a ser deixado pela humanidade quando ela mesma não resistir à sua onipotência. |
Direção: Romy Pocztaruk
Estrelando: Valéria Houston
Texto: Daniel Galera
Produção Executiva: Larissa Ely
Direção de Produção: Larissa Ely
Assistente de Produção: Paula Ramos
Direção de Fotografia: Livia Pasqual
Trilha Sonora Original e Desenho de Som: Caio Amon
Ilustração: Matheus Heinz
Direção de Arte: Romy Pocztaruk
Figurino: Alice Floriano, Larissa Ely, Romy Pocztaruk, Humans and Aliens
Elenco: Renata de Lélis, Camila Vergara, Thais Hagermann
Crédito imagens colorizadas: Matheus Heinz
Crédito fotos do filme: Lívia Pasqual
OUTFEST (Los Angeles)
Fuso Festival Lisboa (Portugal)
Seattle Queer Film Festival (Estados Unidos)
Los Angeles Brazilian Film Festival (Estados Unidos)
Fringe Film Festival (Londres)
Loop Barcelona 2020 (Espanha)
Indianapolis LGBT Film Festival (Estados Unidos)
MIRA ArtRio
28º Festival Mix Brasil
Direção: Romy Pocztaruk
Estrelando: Valéria Houston
Texto: Daniel Galera
Produção Executiva: Larissa Ely
Direção de Produção: Larissa Ely
Assistente de Produção: Paula Ramos
Direção de Fotografia: Livia Pasqual
Trilha Sonora Original e Desenho de Som: Caio Amon
Ilustração: Matheus Heinz
Direção de Arte: Romy Pocztaruk
Figurino: Alice Floriano, Larissa Ely, Romy Pocztaruk, Humans and Aliens
Elenco: Renata de Lélis, Camila Vergara, Thais Hagermann
Cenografia: Livia Pasqual, Romy Pocztaruk
Cabelo e Maquiagem: Juliane Senna
Diretor de Elenco: João Madureira
Motorista: Cássio Bulgari
Montagem: Caio Amon, Leonardo Michelon e Romy Pocztaruk
Primeiro assistente de câmera e operador: Deivis Horbach
Elétrica: Daniel Tavares
Finalização & Cor: Rafael Duarte
Design gráfico: Guss Paludo / Papaya madness
Música Original:
“Fim dos Tempos” (Caio Amon / Romy Pocztaruk /Daniel Galera) Voz: Valéria
“Blue Echoes”(Caio Amon / Romy Pocztaruk /Daniel Galera)Voz: Valéria
Agradecimentos: Luisa Kiefer, Linha, Prefeitura de Santa Tereza, Casio
Arquivos: NASA, Preelinger Archive, USA Atomic Energy Comission
Apoio: Instituto Ling
BIOGRAFIA DE ARTISTA
BIOGRAFIA DE ARTISTA
Foto: Romy Pocztaruk, ela mesma |
Romy Pocztaruk apresenta proposições poéticas que partem do cruzamento entre diferentes disciplinas, como ciências e história, com o campo das artes visuais e do cinema. Participou da bienal do Mercosul em 2013 e 2015, da Bienal de São Paulo em 2014 e do 35 Panorama da Arte Brasileira em 2017. Foi uma das ganhadoras do prêmio Foco-ArtRio em 2016 e finalista do prêmio PIPA em 2018, além de participar de várias exposições individuais e coletivas. Em suas investigações e pesquisas, coloca em evidência o papel do artista frente às questões políticas e históricas do mundo, seja no passado, presente ou futuro. |
FILMOGRAFIA
Safira - (2018, 10min)
TRAILER
SITE
Instagram Antes do Azul
Instagram Romy Pocztaruk
Entrevista com Romy Pocztaruk
Como imaginar o futuro para além dos avanços tecnológicos? Viagens interplanetárias, chips cerebrais, alimentos sintéticos, robôs celulares, teletransporte – sabemos que nada disso é inalcançável do ponto de vista científico. Mas alcançável para quê? Para quem? Quem sobreviverá à destruição contínua à qual a Terra é submetida?
Em um ambiente que nos transporta para uma sala de cinema, Romy Pocztaruk nos apresenta seu novo filme, “Antes do Azul”. Durante pouco mais de dez minutos, seremos submetidos a uma sequência de cenas sutilmente narrativas e radicalmente sensoriais, um jorro de imagens-pensamento sobre a existência e a violência, sobre a passagem do tempo, sobre tecnologias de morte, sobre a potência de corpos animais e minerais, sobre a arte como possível rastro a ser deixado pela humanidade quando ela mesma não resistir à sua onipotência.
Logo no início, o estranhamento que iremos experimentar já se anuncia na presença de um elemento incomum, uma luva com unhas vermelhas. A mão que veste essa luva busca por cristais reunidos em uma pequena mesa. São substâncias minerais e seu mistério que a também misteriosa mão tateia. Uma mulher negra, vivida pela atriz e cantora Valéria (ex-Valéria Huston), ocupa o centro energético do curta. Agora, é ela mesma quem recolhe fragmentos rochosos e os deposita dentro de sua roupa, como se buscando uma fusão entre seus corpos, cindidos há muito tempo. Já nessa cena, nosso olhar não enxerga somente união, mas conflito, impasse áspero, desejo, sentimentos que perpassam todas as imagens.
IMAGENS COLORIZADAS UTILIZADAS NO FILME
Crédito: Imagens de Matheus Heinz
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AR DO TEMPO
Como imaginar o futuro para além dos avanços tecnológicos? Viagens interplanetárias, chips cerebrais, alimentos sintéticos, robôs celulares, teletransporte – sabemos que nada disso é inalcançável do ponto de vista científico. Mas alcançável para quê? Para quem? Quem sobreviverá à destruição contínua à qual a Terra é submetida?
Em um ambiente que nos transporta para uma sala de cinema, Romy Pocztaruk nos apresenta seu novo filme, “Antes do Azul”. Durante pouco mais de dez minutos, seremos submetidos a uma sequência de cenas sutilmente narrativas e radicalmente sensoriais, um jorro de imagens-pensamento sobre a existência e a violência, sobre a passagem do tempo, sobre tecnologias de morte, sobre a potência de corpos animais e minerais, sobre a arte como possível rastro a ser deixado pela humanidade quando ela mesma não resistir à sua onipotência.
Logo no início, o estranhamento que iremos experimentar já se anuncia na presença de um elemento incomum, uma luva com unhas vermelhas. A mão que veste essa luva busca por cristais reunidos em uma pequena mesa. São substâncias minerais e seu mistério que a também misteriosa mão tateia. Uma mulher negra, vivida pela atriz e cantora Valéria (ex-Valéria Huston), ocupa o centro energético do curta. Agora, é ela mesma quem recolhe fragmentos rochosos e os deposita dentro de sua roupa, como se buscando uma fusão entre seus corpos, cindidos há muito tempo. Já nessa cena, nosso olhar não enxerga somente união, mas conflito, impasse áspero, desejo, sentimentos que perpassam todas as imagens.
A partir dos gestos dessa personagem, de suas expressões, seus movimentos, sua voz, seus olhares e os olhares a ela dirigidos, o filme se estrutura, construindo um ambiente em que passado, presente e futuro se confundem. Uma boate do século XXI, a guerra nuclear e a era das cavernas. Tudo ao mesmo tempo agora. Cronologias estilhaçadas entre movimentos de dança, fotos estáticas da ciência sedenta de poder, e uma volta à natureza, uma fuga da ideia de ser humano. A cobra morde o próprio rabo.
Em algum momento, de fato, a frase “o fim dos tempos começou com o fim do tempo” ecoa dessas imagens na voz avassaladora de Valéria. Mas, ao contrário do que pode parecer, a sentença reverbera como um estampido de possibilidades – como se, afinal, fora do tempo da história, que tudo organiza em sua sequência linear, pudéssemos finalmente vivenciar um outro tempo, aquele que não diferencia em essência os corpos uns dos outros, sejam eles minerais, animais, vegetais, espirituais. Um tempo simultaneamente anterior e posterior ao que vivenciamos hoje. Um tempo caro ao universo simbólico como um todo, da mitologia indígena à arte; o tempo que pode efetivamente nos salvar da queda do céu¹, do esmagamento definitivo das nossas multiplicidades identitárias, existenciais. Porém, essa espécie de redenção através de um tempo pré ou pós histórico é ambígua, permeada por imagens melancólicas, entre registros da nossa engenhosidade destrutiva e memórias ou desejos de vivências compartilhadas.
A sequência da boate encarna bem a ambivalência sensorial do filme. Sentada em um balcão de bar (cuja vitrine exibe louças mais ou menos antigas, compondo um ambiente que poderíamos chamar de retrô-futurista), a personagem vivida por Valéria veste uma roupa reflexiva e joias geométricas, possivelmente sinais de um futuro imaginado no passado. O círculo, a linha, o triângulo do seu visual são ornamentos simbólicos capazes de acolher todos os outros; ela é efetivamente o ponto de convergência dos corpos que ali gravitam. Na dança cadenciada entre mulheres, a imagem acompanha seus movimentos quase em câmera lenta, ajudando a imprimir em nós sua atmosfera catártica.
O clima distópico do curta, alcançado, em parte, por cenas como essa da atriz em movimento, vivenciando situações coletivas, e ela só, diante de lugares e objetos obsoletos, por vezes rastros de um futuro utópico não concretizado, parece informado pela urgência do nosso próprio tempo. É como se a personagem vivida por Valéria encarnasse o único ser da espécie humana que viu, vivenciou e, sobretudo, sobreviveu à própria humanidade e à cólera da sua extinção. Ela mesma, a atriz, uma pessoa cujo fenótipo e identidade de gênero a levam a enfrentar constantemente o preconceito, a discriminação e a violência de uma sociedade que quer negar a existência do que não é espelho.
E é nesse tipo de fusão entre o universo profundamente ficcional do curta e o abismo político, ético, humanista cada vez mais desmedido em curso no Brasil (e, por que não, no mundo) que o filme reivindica sua existência poética; a ampliação de um pensamento construído através de subjetividades e em sua defesa, a favor de todos que acreditam e reconhecem o corpo coletivo que nos constitui de singularidades absolutamente interdependentes e conectadas. Ele mesmo, o filme, um corpo coletivo na medida em que se faz através da colaboração entre diversos artistas.
A ficção científica, seja no cinema, na literatura, na arte em geral, sempre ousou especular sobre as consequências da tecnologia e de quem detém o poder sobre ela, figurando como metáfora ou alegoria de diferentes contextos políticos. De um lado, o controle absoluto do Estado, como em vários contos de Philip Dick (e mesmo no clássico “Blade Runner”, filme dirigido por Ridley Scott, inspirado em sua literatura), dá conta de uma realidade subjetivamente empobrecida, incapaz de lidar com a diversidade. Ambientes já devastados e quase sem vida, abandonados à própria sorte em uma natureza exaurida, compõem o cenário de destruição nesse tipo de perspectiva. De fato, a ética na manipulação da tecnologia como um dado crucial para a continuidade ou falência dessa mesma humanidade, é parte da matéria que anima, dá vida, também a filmes como “2001, Uma Odisséia no Espaço”, de Stanley Kubrik, e “La Jetée”, de Chris Marker, construído em sua totalidade por uma sequência de imagens fotográficas – ambas as películas, como Romy em “Antes do Azul”, impactadas pelas tecnologias de comunicação, de guerra, de domínio territorial e espacial²
Mas há também as instalações videográficas misteriosas de Bill Viola, marcadas por um entendimento complexo do tempo, ou o cinema de David Lynch, cujas narrativas, muitas vezes permeadas por uma fusão – ou confusão – de temporalidades, como “Twin Peaks” e “Mulholand Drive”, se abstêm de um sentido de positividade ou negatividade. Ou seja, provocam sentimentos contraditórios no espectador, perturbadores ao extremo em sua proximidade com a experiência onírica da existência em sua intimidade.
Nesse sentido, “Antes do Azul”, consegue fusionar perspectivas nem sempre consoantes no que tange à percepção da tecnologia e sua repercussão na vida humana em relação ao contexto político, social e estético do seu (nosso) tempo extradiegético. Quer dizer, à normatização dos modos de existir, se contrapõe não a submissão coagida, mas a invenção e o prazer de explorar outras potências: corpo, pele, pedras, territórios, tudo contém em si a energia de ser vivenciado de outras formas. A distopia sugerida inicialmente pelo clima de extrema opressão, desespero e melancolia de algumas cenas está acompanhada de um desprezo dirigido a toda forma de domínio tecnológico, simbólico, social.
As imagens se sucedem, corpos em movimento, sons, rastros de outras temporalidades, revistas anunciando a era espacial ao lado de máquinas defasadas, mãos apontando para o futuro que já passou. Uma imagem de bomba atômica leva-nos tanto para cenários de destruição como para experiências da Land Art. Nossos olhos afundam nas imagens movediças, extraviados pelas dificuldades de organizar um pensamento objetivo sobre as fissuras convulsas que aproximam as pulsões de vida e morte na contemporaneidade.
Diante de tudo isso, Valéria substancializa a existência afirmando sua condição de berro, vida pulsante. Uma caverna é sempre refúgio isolado e o universo inteiro de possibilidades.
¹A Queda do Céu, livro escrito pelo xamã yanomami Davi Kopenawa em parceria com o antropólogo Bruce Albers, faz referência à concepção indígena de que o céu está na iminência de romper-se, marcando o fim de um tempo e de todas as formas de vida conhecidas em função da fadiga insuportável imposta ao ecossistema da Terra. Aqui neste texto, “a queda do céu” é também uma referência ao livro de Ailton Krenak, Ideias Para Adiar o Fim do Mundo, no qual o autor, além de comentar a importância da obra de Kopenawa, apresenta uma série de reflexões absolutamente contundentes sobre a concepção de humanidade como principal premissa para o desastre ambiental de nossa era, o Antropoceno. Na obra, ao final de uma das seções do livro, ele afirma: “cantar, dançar e viver a experiência mágica de suspender o céu é comum em muitas tradições. Suspender o céu é ampliar o nosso horizonte; não o horizonte prospectivo mas o existencial. É enriquecer as nossas subjetividades, que é a matéria que este tempo que nós vivemos quer consumir. Se existe uma ânsia por consumir a natureza, existe também uma por consumir subjetividades – as nossas subjetividades. Então vamos vivê-las com a liberdade que formos capaz de inventar, não botar ela no mercado. Já que a natureza está sendo assaltada de uma maneira tão indefensável, vamos, pelo menos, ser capazes de manter nossas subjetividades, nossas visões, nossas poéticas sobre a existência. Definitivamente não somos iguais, e é maravilhoso saber que cada um de nós que está aqui é diferente do outro, como constelações. O fato de podermos compartilhar este espaço, de estarmos juntos viajando não significa que somos iguais; significa exatamente que somos capazes de atrair uns aos outros pelas nossas diferenças, que deveriam guiar o nosso roteiro de vida. Ter diversidade, não isso de uma humanidade com o mesmo protocolo. Porque isso até agora foi só uma maneira de homogeneizar e tirar nossa alegria de estar vivos.” P.32,33
²O mesmo poderia ser apontado em outros trabalhos da artista, como nas séries fotográficas “A última aventura” (2011) e “Bombrasil” (2017), respectivamente sobre os fracassos econômicos, humanitários e ecológicos da Transamazônica e da usina nuclear de Angra 1, dois dos grandes projetos de poder da ditadura de 1964.
Gabriela Motta, curadora, crítica e pesquisadora de artes visuais
Texto de apresentação do catálogo da exposição “Antes do Azul” - Instituto Ling, Porto Alegre, 2019/2020
Veja o Catálogo completo da exposição aqui
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS
Filme “Safira”, de Romy Pocztaruk e Livia Pasqual, 2018, 10min
Justificativa: Primeiro filme da trilogia de filmes "O Fim do Fim" que Antes do Azul faz parte.
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Trilha Sonora Caio Amon
instagram: @caioamon
Justificativa:
Os artistas Romy Pocz & Caio Amon trabalham juntos há mais de 10 anos em projetos que cruzam as fronteiras entre a musica e as artes visuais
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Artista Valéria Barcelos
https://www.instagram.com/valeriabarcellosoficial/
Justificativa:
Importante voz da diversidade no rio grande do sul e sua voz inspirou a criação do filme Antes do Azul
OBRA CONVIDADA
OBRA CONVIDADA
BEEJ
Caio Amon, Edu Rabin e Renata de Lelis (2019, 11min, RS)
Não recomendado para menores de 10 anos
BEEJ foi filmado em um instante decisivo: o dia seguinte à passagem de um ciclone pela cidade de Porto Alegre, Brasil, em 2016. Neste cenário distópico de uma cidade arrasada, a dança butô inspira os movimentos de uma personagem que busca reencontrar sentido. O que parecia estável se rompe quando menos se espera.
JUSTIFICATIVA
Obra que articula a linguagem do cinema com video arte e dança.